quarta-feira, 13 de janeiro de 2010


A mais miserável favela da América
Humberto Trezzi

O que mais impressiona um visitante que chega em Porto Príncipe, como aconteceu comigo em dezembro de 2005, é a escuridão. À noite, a cidade é um breu. Fora escassos hotéis e representações governamentais, os haitianos vivem sem luz. A iluminação das famílias consiste em pequenos fogareiros feitos de latas cortadas ao meio e preenchidas com carvões em brasa. Além de iluminar, são usados para cozinhar farinha e água — quando há.

Isso acontece porque o Haiti não tem fontes de energia. Os raros riachos que cortam o país passam a maior parte do ano secos. Não há hidrelétricas, portanto. Nem reservas carboníferas. As matas, já quase inexistentes, estão desaparecendo porque são transformadas no carvão necessário para cozinhar.

Quem supõe que a África seja a morada do caos é porque não conhece o Haiti. A vida ali consiste numa urgência diária em busca de saciar o mais primitivo dos impulsos, a fome. Multidões vagam pelas ruas à cata de comida, dia e noite. Catam em lixões. É claro que existem criações de porco e galinha. O problema, nesse caso, é a higiene. Carcaças de animais são penduradas em ganchos no meio da rua, sem refrigeração, um luxo inimaginável para a maioria absoluta dos haitianos. Nuvens de moscas cobrem os pedaços de carne expostos em bancas nas calçadas.

Quando acompanhei o Exército Brasileiro, não pude deixar de sentir orgulho. Entre outras tarefas, os soldados estão entre os principais responsáveis pelo recolhimento de lixo em Porto Príncipe e também pelo conserto de ruas e avenidas — no caso, os batalhões de engenheiros.

Arrasado por rebeliões, o Haiti não sobrevive sem ajuda estrangeira. Muito menos agora, arrasado por essa catastrófe natural.

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